Na Terra Indígena (TI) Rio Pindaré, território quase inteiramente localizado no município de Bom Jardim, com uma pequena porção em Monção, no Maranhão – estado que lidera a perda de vegetação nativa no Brasil com um aumento de 95,1%, em 2023 -, a parceria entre dois grupos locais tem um objetivo comum: retomar práticas ancestrais de manejo sustentável e proteger a rica biodiversidade da região. O projeto, denominado “Mãe D’água: das nascentes para reflorestar mentes”, é liderado pelo grupo de mulheres indígenas Wiriri Kuzá Wá em parceria com a Brigada Voluntária Indígena.
Durante as atividades do projeto, mais de 50 mulheres e 15 homens realizaram excursões na mata para identificar cinco nascentes prioritárias e plantar 80 mudas de espécies nativas, como juçara, bacaba e cupuaçu. Essas ações são mais do que esforços de conservação ambiental; elas representam um resgate cultural e espiritual para a comunidade. A liderança indígena local, Vanussa Viana Guajajara, descreve essas excursões como um momento de reconexão com a natureza e com as histórias contadas pelos mais velhos. “É uma parte da história que estava faltando, um vácuo que precisava ser preenchido. Meu pai já foi cacique e contava sobre os lugares que visitamos, dizia ‘Ah, eu conheci, a gente fazia esse monitoramento’”, comenta.
Segundo a coordenadora-geral da Wiriri Kuzá Wá, Marisa Caragiu Viana Guajajara, alguns cenários da devastação promovida por não indígenas no território foram revertidos, mas há muitas ações de proteção e recuperação que precisam ser aplicadas de maneira contínua, ressaltando a grandiosidade do projeto, ainda mais diante dos dados de desmatamento no Maranhão. O trabalho da própria organização de mulheres, brigadistas e outros grupos de proteção territorial, como Guardiões da Floresta e Guerreiras da Floresta, permite a manutenção de tradições ancestrais como a Festa da Menina Moça, que conta com a carne da caça de animais para o preparo do moqueado.
“A floresta e a água são elementos que fazem parte da espiritualidade Guajajara, mas essa não é apenas uma execução pontual. Minha ‘vó’ conta que nosso território foi muito devastado, mas que agora voltamos a encontrar caças para as nossas festas e rituais. Então, quando as atividades do projeto terminarem, daremos continuidade ao monitoramento. Mapear as nascentes, participar do plantio de mudas e conhecer mais do nosso território por meio do projeto são coisas que me emocionam. Isso é essencial para a nossa questão espiritual e ancestral”, declara Marisa.
O projeto – que além da preservação ambiental tem um forte componente educativo e comunitário, envolvendo jovens, adultos e anciãos das nove aldeias do território – conta com a parceira da Associação Indígena Comunitária Mainumy (AICOM) e tem recursos do Podáali (Fundo Indígena da Amazônia Brasileira). O Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) fornece apoio e assessoria técnica na elaboração e nas atividades de campo. “O projeto abrange a discussão das ações no passado que resultaram na degradação das florestas e as ações necessárias para o futuro, como iniciativas de restauração e melhor gestão do território e seus recursos. Envolve não só o plantio e os cuidados (podas, prevenção do fogo, limpezas, etc.), como também uma discussão mais geral sobre as espécies, seus usos e sua importância cultural. Dessa forma, podemos falar em uma ‘restauração biocultural’, que abrange tanto os aspectos ambientais e biológicos, como os culturais”, explica o assessor técnico do ISPN, Robert Miller.
Restauração florestal no Marajó (PA)
No Pará, a Rede Raízes – formada por um grupo de mulheres e homens agroextrativistas – tem protagonizado ações de restauração florestal, com o objetivo de disseminar conhecimentos sobre produção de mudas, auxiliar na mobilização e organização de mutirões comunitários para a implantação de Sistemas Agroflorestais (SAF’s) e contribuir para a gestão de empreendimentos comunitários locais.
“Os SAF’s se apresentam como um contraponto à monocultura, que tem baixa diversidade de produtos, o que acaba esgotando os nutrientes do solo e incentivando a proliferação de pragas e doenças”, afirma Deborah Pires, engenheira agrônoma e analista socioambiental do IEB.
A Rede Raízes é uma continuação do processo formativo iniciado no Marajó Socioambiental 2030, realizado pelo IEB com apoio financeiro do Fundo Socioambiental da CAIXA. Desde 2021, o projeto promove ações de restauração na região de Marajó (PA) e tem como meta plantar 500 mil mudas agroflorestais; até o momento, 240 mil mudas já foram plantadas no território marajoara. Além da importância ambiental, as espécies escolhidas apresentam potencial para aumentar a segurança alimentar e a geração de renda das famílias envolvidas.
A expectativa é que a Rede Raízes possa contribuir para diagnosticar e problematizar as diferentes realidades do território, ajudando nas soluções adequadas para cada comunidade, o que contribui para o fortalecimento da agenda de restauração florestal socioprodutiva e na gestão dos empreendimentos comunitários.
Unidades de Conservação e a preservação das florestas
O que um ganhador do prêmio Nobel e uma família ribeirinha da Amazônia possuem em comum? O respeito pela floresta. A série “Em Clima de Amazônia”, produzida pelo Idesam, traz o depoimento do ecólogo e pesquisador do Inpa, prof. Philip Fearnside, sobre as Unidades de Conservação. Confira o episódio completo clicando aqui e uma prévia, abaixo.
“A floresta amazônica está sendo ameaçada. Quando eu cheguei, a primeira vez, em 1973, estava só iniciando essa fase moderna de desmatamento com a construção da rodovia transamazônica. Hoje, nós temos 20%, mais 700 mil quadrados desmatados. E o processo vai indo. A floresta amazônica oferece serviços ambientais que são essenciais para a população que vive na Amazônia, também para o resto do Brasil e, em alguns deles, também para o resto do mundo. Ela é um grande reservatório de biodiversidade que tem muitos valores, mas também muitas utilidades. É muito importante para o clima, de várias maneiras. É importante para o ciclo de água, que é essencial para manter uma floresta tropical.
Unidades de conservação, áreas protegidas em geral, são essenciais para evitar o desmatamento. Não só agora, mas também para o futuro. Unidades de uso sustentável, como reservas extrativistas e projetos de desenvolvimento sustentável, têm um papel muito importante; sobretudo para manter as populações e para poder expandir rapidamente as áreas protegidas. As reservas de desenvolvimento sustentável, as RDS, são importantes porque é uma maneira de sustentar uma população local que já está lá, evitando que a área seja transformada em grandes fazendas.
A RDS Uatumã é uma reserva de desenvolvimento sustentável que foi estabelecida ao longo do rio Uatumã, entre a área de Balbina e o rio Amazonas. Tem uma população que dependia de pesca. A pesca foi abalada com o efeito da barragem e a agricultura de pequena escala. Tem uma população que está sendo apoiada, que está tentando mudar as formas de produção: ter mais agroflorestas, venda de vários produtos produzidos no local, esquema de pagamento pelos sequestros de carbono, pelas árvores que estão sendo plantadas. Tem várias coisas diferentes de outros lugares”.
Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã (AM). Foto: Divulgação / Idesam
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ISABELA LAURIA DE TOLEDO
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